quarta-feira, 14 de abril de 2010

Vida em morte

Era trinta de Julho, eu me lembro muito bem dos detalhes. Eu era apenas uma garota, meus cabelos presos em um rabo-de-cavalo aparentavam-me 12 anos, mas eu não os tinha. Eu era uma garota, sim, com toda certeza era. Só que era uma garota de 16 anos, uma pequena e indefesa garotinha.

A praça nublada ainda faz cenário ao que eu achei ser um filme de terror. No meio daquela nuvem formada, respirar me doía, cansava. Eu estava sozinha, com medo e frio. Eu estava precisando de alguém que me mostrasse o caminho para sair correndo dali, daquilo que, pelo menos quando o sol resolvia aparecer, era tão belo para se brincar.

Não estava nos meus planos encontrá-lo ali, ao vê-lo em minha frente achei estar vivendo um sonho. Mas que estranho seria eu ter a certeza de que era apenas um sonho. Não, não era. Ele havia de ter me deixado há, pelo menos, dois anos. Meu primeiro amor, meu primeiro namorado, minha primeira derrota. A morte venceu e tomou-o de meus braços.

O nó em minha garganta pareceu real demais para quem estava vivendo apenas um sonho. O inalar quente, a dificuldade em formar palavras...Tudo pareceu real demais para dizer que era mera fantasia.

Uma eternidade se passou em minha mente, segundos passaram realmente, até que meu cérebro mandasse meus lábios jogarem em cima da estátua em minha frente uma enxurrada de palavras tremulas demais, reais demais.

- O que você está fazendo aqui? Eu estou sonhando? Por que sei que estou sonhando? Você...Você morreu.

Ele sorriu pra mim, um sorriso que eu pensei ser triste e, naquele instante e pela primeira vez desde que ele se pôs em minha frente, percebi que ele não havia mudado em nada. Seus cabelos ainda estavam do mesmo comprimento, seus olhos ainda eram os castanhos mais belos que eu já vira, sua boca era aquela que eu tanto adorava, e seu sorriso ainda me trazia paz.

Sim, eu morri. E agora você veio ficar comigo, meu amor. A morte nos deu o reencontro. Disse ele, olhando em meus olhos e transparecendo a verdade da frase.

Tentei me concentrar o máximo possível em sua frase, e não na sua voz grave que me fez sorrir tantas vezes. Lembrei-me, então, de que desde que ele se fora eu andava triste demais, doente demais. Lembrei-me, também, que eu pedira tantas vezes para ficar perto dele. Jamais pensei que seria atendida.

Morrer não era mais o filme de terror do início, aquela neblina e aquele parque - que realmente não era o de minha cidade natal - estavam mais belos. Se eu forçasse meus olhos até enxergaria a grama verde e as flores brotando.

Eu não estava morta. Em corpo, obviamente, estava. Mas minha alma renasceu! Eu voltara a vida, a vida que achei na morte. Depois de dois anos de espera, eu finalmente o vi. Eu finalmente sorri. Eu finalmente me tornei eterna. Uma eternidade pronta para viver pra ele, por ele, com ele.

domingo, 4 de abril de 2010

O amor é o dom supremo

Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, serei como o bronze que soa ou como o címbalo que retine.

Ainda que eu tenha o dom de profetizar e conheça todos os mistérios e toda a ciência; ainda que eu tenha tamanha fé, a ponto de transportar montes, se não tiver amor, nada serei.

E ainda que eu distribua todos os meus bens entre os pobres e ainda que entregue o meu próprio corpo para ser queimado, se não tiver amor, nada disso me aproveitará.

O amor é paciente, é benigno; o amor não arde em ciúmes, não se ufana, não se ensoberbece, não se conduz incovenientemente, não procura os seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal; não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade; tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.

O amor jamais acaba; mas, havendo profecias, desaparecerão; havendo língua, cessarão; havendo ciência, passará; porque, em parte, conhecemos e, em parte, profetizamos.

Quando, porém, vier o que é perfeito, então, o que é em parte será aniquilado.

Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, pensava como menino; quando cheguei a ser homem, desisti das coisas próprias de menino.

Porque, agora, vemos como em espelho, obscuramente; então, veremos face a face. Agora, conheço em parte; então, conhecerei como sou conhecido.

Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três; porém, o maior destes é o amor.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Não, o tempo não para

Que bonito seria se o tempo realmente curasse tudo. Bonito seria se ele, o nosso precioso tempo, cicatrizasse até o maior machucado. E ele cicatriza, quando se fala de feridas externas, ele cicatriza. Cicatriza a casca onde escondemos o que realmente queremos que cicatrize, sare de vez: a dor do coração.

Aquele órgão que rotulamos ser a peça chave do amor. Até desenho dele o ser humano inventou, somos estranhos. Sim, vou mais longe... Nós, seres humanos, somos anormais. Voltemos às cicatrizes.

Bem, quem dera a nós se o tempo fosse tão forte que pudesse ser capaz de retirar até o mais profundo desgosto, mais profundo sentimento ruim., Quem dera a nós se o tempo fosse tão bom quanto dizem.

O tempo não é nada, mais muitas vezes pode ser tudo. O tempo serve para nós deixar mais velhos, não sejamos rudes: mais "experientes". Óbvio que existe muitos senhores pós 70 sábios, mas não foi o tempo quem os fez assim. Foi a vida.

Ai, a vida. A vida sim deveria ser algo vangloriada, exaltada, comemorada. Cada segundo (reparem no tempo) deveria ser intensamente vivido. Mas não é bem assim, nós jamais daremos o valor que a vida merece. Somos tão bobos, tão programados por frases feitas, que continuaremos a dizer: "o tempo é o melhor remédio".

E enquanto o seu tempo passa, eu continuo aqui. Enquanto a cada instante eu vou ficando mais velha e mais triste, continuo aqui. Continuo a esperar que uma mistura fatal de tempo me leve embora. Para onde? Além dos seus olhos. Continuo a esperar que o tempo seja companheiro, que ele faça valer toda essa espera angustiante. Continuo a esperar que o tempo, o nosso amado e idolatrado tempo, traga você para mim.

Natal

A chuva cai por de trás do vidro, os relâmpagos formam no céu um espetáculo parecido com fogos de artifícios brancos. Tão belos seriam se não fizessem tanto estrago. A chuva cai por de trás do vidro e com ela caem ideias. Minhas ideias, minhas inspirações. Tudo jogado no chão, tudo em uma grande poça.

Hoje seria um dia chuvoso normal, tirando o fato de ser 24 de Dezembro, véspera de natal. A época do ano em que não preciso de um motivo maior para sorrir, a única época do ano em que não preciso.

São duas horas da tarde, e o cheiro da ceia que mamãe prepara começa a se entranhar pela casa, fazendo meu estômago criar vida. São duas horas da tarde e eu, ao invés de ajudar com a sobremesa, estou trancada em meu quarto, abraçada a um pedaço de papel amassado e uma caneta BIC que já falha pela terceira vez.

Não sei o que aconteceu, mas está véspera de natal me deixou nostálgica. Me fez lembrar de todo um passado, até mesmo dos momentos em que lutei para apagar. Nem o cheiro delicioso e as risadas empolgadas vindas da sala me fizeram ter vontade de sair e me divertir também.

Que triste falar assim. Que triste é ser triste em uma época onde, em todos os cantos do mundo, há risadas e sorrisos nos rostos. E por que eu? Por que escolher a mim, tristeza? Por que justo na época em que eu mais gosto? Ou gostava.

Tudo bem, daqui a pouco todos irão se reunir embaixo da árvore, trocarão presentes e meu irmão irá perguntar como papai Noel adivinhou exatamente o que ele desejou durante o ano. Eu irei sorrir para ele, em troca ele me mostrará a língua e mamãe irá intervir com uma de suas frases clichês: não briguem pelo menos hoje, é natal.

O natal é maravilhoso, mas esta chuva me atrapalhou. Atrapalhou o que eu planejei dura o ano inteiro, atrapalhou a felicidade que o natal trazia consigo, atrapalhou pelo menos para mim.

Eu sei como este dia irá prosseguir: ficarei mais duras horas olhando para meu espetáculo particular de fogos, limparei as lágrimas no canto dos meus olhos, lágrimas estas que o relembrar me trouxe. Sairei do quarto com um sorriso forçado, sorriso este que se tornará sincero quando toda a família sentar no sofá e começar a contar como meu primo nasceu, e que naquele horário, há tantos anos atrás, todos estariam passando o natal no hospital, rezando pela sua chegada triunfal. Terminaremos nosso natal rindo da cara do vovô e das palhaçadas que ele faz por beber uma dose a mais de vinho, ficaremos assustados quando vovó ficar nervosa e começar a tossir. Mas no fim, não tão esperada meia noite, todos irão se abraçar e eu sentirei o amor transpirar por mim e por todas as pessoas queridas ali presentes.

E eu sei o porquê de estar "menos feliz" do que nos natais antecedentes, mas as linhas deste meu rascunho estão no fim e falar sobre isso acabaria me deixando mais de duas horas a admirar o céu. Céu este que eu trocaria para estar em outro lugar: nos teus braços. Braços estes que eu desejei com todas as forças que estivesse por perto pelo menos hoje, ao menos agora que tanto preciso... E o papel, uma vez apenas amassado, agora está borrada por minhas lágrimas natalinas.