segunda-feira, 17 de maio de 2010

É, eu caí

Eu reconheceria de longe aquela pista no meio das árvores altas e verdes, mesmo depois de anos. Era o parque em que todas as crianças da cidade se reuniam, era o parque cujo escorregador era o mais alto de toda cidade.

Eu estava andando sob as pedras presas no chão, saltando por cima das quebradas, rindo comigo mesma até meu súbito ataque de nostalgia ser interrompido por uma voz que eu reconheceria mesmo a mil passos de distância.

- Vamos, filha. Anda, é a última descida. Seu pai já deve estar com o churrasco quase pronto e eu nem comecei a salada de batata ainda.

Lá estava. Uma pequena menina de olhos azuis, cabelos dourados e encaracolados nas pontas pronta para descer o mais alto escorregador que ela já vira em sua vida. A dona da voz melódica estava bem aos pés daquele monstro prestes a ser domado pela garotinha, e ela sorria junto com a filha.

Estaria eu sonhando mais uma vez? Logo pensei: o típico churrasco da família Lucena Cidade. E sorri ao lembrar a carne mal passada preparada por papai, era uma manhã inteira de preparo. Mas, segundos depois, lembrei-me que nunca fomos uma família, ou melhor, nunca fomos felizes. Não juntos.

Mal sabia aquela garotinha que, dez anos depois, seu papai não estaria mais ali e os churrascos de domingo seriam extintos completamente de seus fins de semana. Mal sabia aquela garotinha de olhos tristes que teria de amadurecer rápido e cedo demais para cuidar e aconselhar sua mamãe. Mal sabia ela que seus problemas não seriam tão fáceis quanto descer deitada o escorregador.

Agora o escorregador era um precipício, e quem estava no topo dele era eu. Sem saber o que fazer, mais uma vez. Era eu sem saber se me machucaria ao pular dali, ao saltar em queda livre daquele que antes era um mero brinquedo. Era eu, mais uma vez - e por causa das malditas lembranças -, sem saber como ser feliz, e se seria ao saltar sem volta dali.

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